Admmauro Gommes
Poeta, cronista,
palestrante, professor
de Literatura da FAMASUL
(Palmares/PE)
admmaurogommes@hotmail.com
Por ser a
primeira instituição criada, e que se mantém tradicional, a família tem lutado
muito para se adequar às regras de nosso tempo. Ninguém tem dúvida de que nos
últimos anos tudo mudou, e que ela também vai mudar. O problema é saber onde
exatamente cabe a mudança. Mesmo que assim se entenda, será impossível alterar sua
essência. Traços como afeto e ternura, comunhão e partilha são indissociáveis
de seu núcleo. Para que não haja confusão, é bom destacar a linha tênue que
divisa casamento e família, família e empresa, o que faremos mais adiante.
Parece
contraditório, mas ainda nesta era de tanta tecnologia e modismos universais,
os preceitos para se criar filhos obedecem a uma forma instintiva por parte da
mãe e do pai. Tanta psicologia não tem dado conta para explicar e orientar as
infinitas reações diárias que os filhos emitem (ou omitem). Não se pode colocar
o rigor formal de uma cartilha para instruir uma descendência, pois os mesmos mecanismos
utilizados com sucesso por uma mãe, no filho primeiro, não funcionam
adequadamente no segundo, porque este é outro e a mãe também é outra, para
lembrar Heráclito (não se passa pela segunda vez no mesmo rio). As sugestões
científicas, postas como normas, podem indicar favoráveis caminhos mas não
garantem a eficiência dos procedimentos utilizados nos diversos casos.
Na
verdade, os manuais pouco ajudam. O cuidado com a aplicação de infindáveis
regulamentos, táticos e técnicos, na condução do lar, pode ser perigoso e
transformar a família em uma empresa. Esta visa primariamente ao lucro e não
deve ser domesticada pois, ao perdoar as dívidas, a falência será inevitável. Enquanto
aquela, procura a satisfação e o bem-estar de seus componentes e não pode ser
administrada como um CNPJ porque transformaria afetos em números. Confundir
empresa com família é decretar a falência de ambas. Como representam polos
distintos, os fins a serem alcançados são diferentes, constituindo-se grande
erro entender a organização familiar como bolsa de valores, que quantifica o
benefício e o transforma em ganho. Certamente, nenhum pai espera ressarcimento
de tudo quanto investiu na formação de seu filho.
Que
ninguém se engane, o casamento, enquanto instituição social, vai continuar
sofrendo as mutações de cada geração, mas a família permanecerá. Um dos maiores
golpes, felizmente fracassado contra a família (não contra o casamento) foi
elaborado por Platão, em A República. Nesta obra, o filósofo sugere que todo
homem fosse criado pelo Estado, logo após o nascimento, bem longe do seio
materno, para que se apagassem os vínculos afetivos. A ideia era fortalecer o
Estado como dominante absoluto, anulando a base doméstica o que, segundo essa
proposta, isentaria o ser humano de se envolver emocionalmente ao julgar ou
favorecer os seus, pois não mais os conhecia. Na verdade, o plano era destruir
o núcleo familiar. Mas isso não aconteceu e nem vai acontecer, pois o humano
desprovido de sentimento não é mais humano e sem a família todos perdem a raiz
e facilmente se evaporam.