Por Vital Correia de Araújo
Abaporu (pintura a óleo de Tarsila do Amaral) |
Ele
tem liderado a batalha vital pela dessentimentalização da poesia, cuja frente
principal é a tal de inspiração.
Recentemente,
ele levou à classe uma lata de papel de margarina e incentivou os alunos a se
inspirarem nela e produzir poemas durante a aula. O resultado foi
surpreendente.
Cerca
de 15 poemas, feitos ex-abrupto de bom nível e fiéis à temática inusitada. Algo
surpreendente que degrada o elemento inspiração, tão valorizada por poetas
relativos.
No
outro lado da questão “romântica” que induz o poetar, está o sentimento. Hoje,
é unanimidade na FAMASUL (Cícero Felipe, Sylvia Beltrão, Ricardo Guerra, Wilson
Santos (ainda não), e o próprio AG) que poeta melhor é o de alma seca.
Convenho,
no entanto, que não se pode prescindir da sensibilidade que é o sentimento, em
nenhum ato ou fato da vida.
No
entanto, a questão é a fragilidade ou pejoração de que se acoimam os usos do
sentimento na poesia.
Daí,
proponho o termo feeling poético, expressão que supera o conceito tão abusado
de sentimento, no Brasil.
Poesia,
hoje, não pode ter a haver com razão, pensamento, sentimento. Assim
consideradas, estas instâncias reduzem-se, na poética, a domínios do ego,
portanto monopólios egoicos, encampação egoísta do resultado ou produção do
trabalho poético. E despreza a ação vital do instinto inconsciente como
instância criadora. A razão (prática) apela ao sentimento, mobiliza-o e este
aparece como condição do humano. O que, além de não ser verdadeiro, não é nada
poético.
O
poema não é fruto de algo racional ou sentimental (em conjunto ou não) porém é
uma insight do feeling.
Não o
gera (ao poema) hábito ou crença, não é saber ou credo (automática inspiração,
dom divo, posse romântica, expressão do coração); não é resquício de uma
devoção religiosa, algo que veio desde as infâncias, possessão de algum deus
lírico, determinação familiar, dons de genes, nada disso. Poesia é cognição
fruída de fonte ídica. Pecado novo, pranto dos olhos, pálpebras congeladas,
pestanas árduas. Discurso do inconsciente. Encaixe na episteme da época.
É
qualidade do poema parecer esotérico ante o senso comum... e este é ignaro.
Episteme
da época congloba uma atitude em que o saber se eleva e cria uma cognição
superior. Sabedoria interior. Desejo e gozo líricos.
Em
poesia absoluta, sintetizo: nihil est in sensu quod non prius fuerit in
intellectus, antiperipateticamente patético.
A
introvisão (o isight) é de natureza cognitiva, nada sentimental ou sensitiva.
Há
uma necessária preterição, portanto, dos processos operadores da consciência em
favor daquelas suficientemente inconscientes. Seja isso o que queira dizer a
mais (e melhor).
O
sentimento não há como utilizá-lo criativamente, ele despedaça a imaginação,
falsifica a verdade poética, disfarçado em algo bom, elevado. Já o feeling
consulta a intuição, é complexo, instintivo, largo, lírico por natureza.
O
feeling poético induz, pressupõe ou gera um campo lírico, onde o dínamo
sintagmático atua gerando poemas absolutos. E estes rejeitam quaisquer análises
superficiais, habituadas a tratar da velha poética, caracterizada pelas marcas
anacrônicas de rima, pés, estrofes metrificadas etc.
É que
a análise do poema elementar visa destacar ou destocar, tirar da toca os dados
explícitos e não construir possibilidades de vário entendimento. A poesia
absoluta tem mais a ver com destruição vocabular, frásica, gramatical, do
discurso do que construção. Daí, figuras exponenciais da teoria absoluta
(Admmauro Gommes, Marcondes Torres Calazans, João Constantino, entre outros)
dedicarem-se a explorar várias vertentes do desconstrutivismo.
Vital Correia de Araújo |
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