O SABOR DA PALAVRA NÉSTOGAS
Márcia Maria da Silva
Pós-graduada em
Língua Portuguesa/FAMASUL
Márcia Maria da Silva |
Entende-se
por neologismos palavras inventadas, espontaneamente, a partir de outras
existentes na língua. Na opinião de José de Alencar: “Criar termos necessários para exprimir os inventos recentes,
assimilar-se aqueles que, embora oriundos de línguas diversas, sejam
indispensáveis, e, sobretudo explorar as próprias fontes, veios preciosos onde
talvez ficaram esquecidas muitas pedras finas, essa é a missão das línguas
cultas e seu verdadeiro classicismo."
Atentos
a Alencar, podemos dizer que inventar, criar é próprio do artista, logo, o
neologismo, já deveria ser conceituado como uma obra de arte. A própria palavra
é a forma verbal que, em síntese, é pura literatura e não importa a época e nem
o poeta, só a poesia. Como diz Guimarães Rosa "(...)
Já outro, contudo, respeitável, é o caso - enfim - de 'hipotrélico', motivo e
base desta fábrica diversa, e que vem do bom português. O bom português, homem
de bem e muitíssimo inteligente, mas que, quando ou quando, neologizava,
segundo suas necessidades íntimas.”
Assim,
a palavra, segundo Saussure, não tem sentido, tem emprego. Isso faz “sentido”.
A palavra não necessariamente precisa ser escolhida por um gramático e ter seu
significado pronto, lapidado. É sublime que o leitor faça dela sua própria
interpretação, ora, lendo uns tantos poemas de Admmauro Gommes, deparei-me com
uma palavra desconhecida: “néstogas”, e adorei não ter sido apresentada a ela
anteriormente, pois acredito que iria quebrar a magia do meu descobrimento.
Veja o texto:
“Néstogas:
momentos de êxtase
em transiúnica vida
onde flâmulas cardinais
conjugam o enigma
com flauta e cítara
destilando um mármore
audível...
(...)
As néstogas, ou seja,
ogivas de pêssego
(...)
Enfim, néstogas:
o íntimo do átomo.
“Néstogas!”
Um dos meus sensores, repentinamente acionou o paladar. E logo me vi saboreando
um pouco do néstogas, e parecia-me tão doce, tão puro, que me transportei a um
tempo passado onde me deliciei com as melhores coisas da minha vida e foi lá
que encontrei as néstogas que se referiam o poema.
Então,
me perdi no poema de Admmauro Gommes e me achei nas palavras de Saussure. O
poema Néstogas pode ter múltiplas interpretações, como já define o poeta, “momentos
de êxtase” “ogivas de pêssego” “o íntimo do átomo...” É essa interpretação
subjetiva que nos leva a viajar a lugares memoráveis e nostálgicos. Imagine ser
o íntimo da menor partícula! É de uma especialidade sem tamanho, de uma
intimidade profunda, de uma cumplicidade única. O fruto adocicado e macio
torna-se ainda mais saboroso porque dentro dele tem néstogas e uma explosão de
sensações lhe domina, lhe arrebata e transforma sua vontade de ver o mundo, de
escutar a mais bela voz, de provar do melhor néctar, de sentir o melhor desejo,
de chorar a mais triste lágrima, de extravasar o último riso... Estas sensações
incomparáveis só serão vistas sob seu próprio olhar, seu próprio sentir, seu
próprio tocar.
É
isso que a palavra diante de uma subjetividade faz. Mesmo sem conhecê-la, mas
que dependendo do seu emprego, pode-se utilizar em situações diversas e
inimagináveis, como “néstogas”. Esta é a verdadeira proposta da Poesia
Absoluta.
O
que é “néstogas”? Não sei até hoje, mas dela provei.
ResponderExcluirNéstogas é tudo que se pode dizer diante do indizível.
Às vezes faltam palavras para expressar tamanha emoção, então que se digam néstogas, nesses instantes, como em "momentos de êxtase..."
A poesia absoluta nos remete algo indefinível, que não se baseia em significações para existir. Sua natureza já traz consigo uma acepção subjetiva, que partindo das sensações pode-se identificar o “lugar” que nos leva à palavra.
ResponderExcluirEis então que surge o caminho...para aonde nos levará Néstogas!?
(ROMILDA ANDRADE)