20 de junho de 2012

VITAL CORRÊA NA FAMASUL


Vital Corrêa de Araújo
              O poeta Vital Corrêa de Araújo esteve na FAMASUL no dia 5 de junho/2012, falando de sua poética. Veja a repercussão da passagem deste grande escritor nos depoimentos de professores e universitários.  



PESCARIA COM VITAL CORRÊA DE ARAÚJO

Admmauro Gommes,
poeta e professor de Teoria Literária da FAMASUL (Palmares-PE)
       
Nos primeiros momentos em que tive contato com a poesia de Vital Corrêa de Araújo, a imagem que logo me ocorreu foi a que quando eu era ainda criança, acompanhei meu tio em uma pescaria. O filme repassou completo em minha mente, durante a leitura de seus textos. O meu tio pescava em uma parte do pequeno rio que fazia uma cachoeira de aproximadamente um metro e meio. No desaguar do riacho, os peixes entravam em atrito com as pedras mais profundas, pulavam e saíam das águas como se tivessem fazendo acrobacias, e voavam. Cada um me surpreendia porque eu não tinha ideia de que parte do rio eles apareciam. Esta mesma cena me surgiu ao ler os poemas de Vital. Parece que as palavras deste poeta, quando entram em atrito com a folha d’água do livro, sobressaem e nos surpreendem, aos pulos, enigmáticas.
Às vezes, não dava para descobrir a espécie que saía das águas, na época do meu tio. Assim, como em um rápido olhar, quase não decifro o sentido metafórico da palavra vitalina. Aliás, como ele mesmo propõe, "o poema é algo trisambíguo", pois vai além da ambiguidade que já é polissêmica, na mais simples expressão. É que os peixes saem das páginas dos poemas de Vital, como as metáforas voavam no riacho. Eu não sei por que essas imagens se confundem. Talvez elas me comuniquem algo ligado ao doce da infância, ao vazio indizível, perceptível apenas nas linhas do texto e do anzol, como quem brinca com peixes ou pesca palavras.
Para mim, a poética de Vital triunfa emblemática, pois eu não sabia de onde vinham os peixes que se renovavam, também não decifrei como nascem as combinações inusitadas em Vital Correia. A cada palavra é um peixe diferente, conotações inauditas que nos levam a contemplar a correnteza caudalosa de seus versos. O mais interessante é que o rio não se esgota, é que a efervescência das letras não encontra um fim, quando continuam reinventando a vida, o desejo de interpretar o espetacular conflito do homem com ele mesmo.
Como aqueles voos cegos de pássaros/peixes que duravam fração de segundos para que saíssem da água e para ela voltassem, os textos de Vital também são assim. Apenas um breve olhar já é suficiente para que a mente fotografe as águas do livro, ou a página do rio. As imagens tanto da minha infância quanto as de agora, pela ótica desse poeta, mesmo sendo em rápida observação, permanecerão por muito tempo em minhas retinas, fruto de algo sempre novo, saindo do velho rio, contudo indecifrável como é a essência do próprio ser, nessa pescaria sem fim, que é a vida.

Vital Corrêa, Admmauro Gommes e o Professor Orlando, na Biblioteca da FAMASUL


UM POEMA DE VITAL CORRÊA DE ARAÚJO
(do livro Ora pro nobis scania vabis)

5.5

Baías se afogam no próprio estrato
musgos se engasgam com feldspatos
bombas bebem sais de nitrato
perfumes endeusam o átimo das narinas
antros prismáticos de obscuros aromas
cicatrizes de estrelas, betumes solares
escuras feridas iluminam
maestros encarcerados
à luz de violoncelos e guitarras ígneas
procuram a saída
tocam a fuga
violam sinfonias
que títeres anunciam à beira de suas piras.
O sangue inacabado das semifusas
grito das pautas, o que o id salmodia
e a seiva obscura dos sulfatos
abolem significados vazios.
Ruínas ressoam, lumes se extinguem
luzes oblongas (dos poros anoitecendo)
poros que tremulam cabem no poema
enquanto arqueologias sonham
com fêmures enterrados em setembro
nas covas do poema.


COMENTÁRIOS
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1. POESIA PARA CAUSAR EFEITOS E SENSAÇÕES
Emylayny Sarayna dos S. F. Filho/ IV Período de Letras/FAMASUL

Para Vital Corrêa, a poesia não necessita de razão e lógica, pois não é feita para ser entendida. Logo, não é necessário usar o significado e sim o significante, utilizado-se de jogo de palavras que vem do inconsciente da pessoa que escreve. A poesia é construída para causar efeitos e diversas sensações, e inspiração e tema não existem nela, pois o poeta usa de técnicas e imaginação para criar e a poesia vem do conhecimento que cada um possui. O escritor é totalmente contrário ao uso da rima no poema, pois ela condena o poema e não o salva. Desse poeta, é o que se pode dizer de um escritor modernista, por valorizar os versos e ritmos livres, aplicação de palavras com ousadias e empregadas de maneira não tradicional, com desapego da lógica.



2. SE A POESIA NÃO TEM SENTIMENTO, O QUE HÁ NA POESIA?
Marinês Alves de Souza/ IV Período de Letras/FAMASUL

 
 
Para Vital Correia a poesia não tem sentimento, ele expressa isso ao dizer que “Quando há sentimento não há poesia, o sentimento não tem nada haver com poesia, o sentimento faz a mão tremer e bloquear a ação do poeta.” Com esta palavra, Vital nos deixou no instante intrigados. Se na poesia não existe sentimento, o que há na poesia? Durante minha trajetória escolar, aprendi que a poesia estava em toda parte: Nas canções de ninar, nas cantigas de roda, nas quadrinhas populares, nas letras das músicas, nos livros (...). Dentre várias definições que conceituavam a poesia, o poeta francês Mallarmé, que define como: “A suprema forma de beleza,” o americano Edgar Allan Poe: “É a criação rítmica de beleza.”
No entanto, assim como Vital, Ricardo Cassiano Monize diz: “Pouco importa, contudo o que importa literalmente é que ela encontre seu núcleo no poema e seja indefinível, porém definidora.” Mesmo assim,  Vital Corrêa afirma que o pensamento atrapalha a poesia. A poesia é um jogo, este que, se decifrado, não é um jogo muito menos poesia. E adiantou: “Não devemos perder tempo com poesias banais, pois estas fazem o nosso psíquico diminuir gradativamente. É preciso o complicado, o não entendimento para que se tenha uma poesia precisa e de difícil acesso, afinal é por meio dela que nosso raciocínio se eleva e nos tornamos mais críticos diante  das circunstâncias do meio acadêmico.”
Em contrapartida as concepções de Vital. O que poderia ser a Poesia? Um recurso textual que se constrói através de ideias, sentimentos, versos e em seus recursos musicais? Ou uma poesia complexa, onde a leitor se faz ‘’obrigado ‘’a pensar e não o poeta pensar por ele. A temática referente aos esclarecimentos perante a combinação dos versos X poemas X estrutura, pôs-nos a entender por que Vital abordou Augusto dos Anjos, de onde utiliza poemas estranhos de toda a nossa literatura, assim como as definições acerca da poesia complexa por Vital (2012): “A poesia complexa desenvolve os neurônios”.
Os questionamentos diante da suposta situação me fazem perceber que a poesia não usa significado, mas significante, por isso o não entendimento.


3. POESIA NÃO NECESSITA DE MÉTRICA, PRECISA DE OUSADIA
Mariana Machado de Lima/ IV Período de Letras/FAMASUL

            O Professor Vital relata que para ele a poesia é feita de “significantes e não de significados”, como na poesia de outros autores. Ele fala que faz poesia para o deleite, tudo isso com um único objetivo: que o público sinta-se dentro de um cenário antagônico, que lhe permita pensar, pois quando se consegue desvendar o significado da poesia deixa de ser insinuante e que o importante é ler coisas instigantes que nos conduzam a transcender o real, o que está posto diante de nossos olhos, o conformismo que para nós literatura e poesia são a mesma coisa, com Vital surpreendentemente torna-se sem efeito Começamos a perceber que tudo o que se poderia esperar dentro de métricas não tem mais significado, “a poesia não necessita de rimas”, de combinação de palavras, precisa de sentimento, de ousadia, imaginação, criatividade para que encontre cumplicidade com aquele que a está recebendo. A primeira vista, o que poderia até nos parecer fora de foco e desprovido de lógica, passa a ter sentido. Vital Corrêa de Araújo é realmente uma mente privilegiada, com um talento que conduz a quem lhe escuta a outro nível, com uma visão diferenciada, defende de maneira veemente seu ponto de vista, que nos faz rever os nossos próprios.


4. A POESIA NO COTIDIANO
Shirlene Priscila de Mélo Correia/ IV Período de Letras/FAMASUL

                Vital Corrêa, grande poeta pernambucano, deu início a palestra perguntando o que é poesia. E em seguida respondeu que não tem definição objetiva e que para ele é realidade, onde se pode expressar melhor a vida.  Vital considera-se um poeta seco, pois quando sente emoção não consegue escrever. Ele disse que sentimento não tem nada a ver com poesia. E afirmou que muitos leitores reclamam porque não conseguem entender algumas poesias, e comenta que poesias não são feitas para os leitores entenderem, pois a poesia é formada pelo significante e não contém significado.
            A palestra com Vital foi muito interessante, pois ele mostrou a importância da poesia no cotidiano da vida, a maneira de expressar quando fala de escrever. Quando fala de poesia é muito bonito. Enfim, ele fala com entusiasmo fazendo com que as pessoas se sintam curiosas e comecem a ler e escrever poesias.


5. A POESIA E AS IDEIAS INTANGÍVEIS
Nailza Maria da Silva/ IV Período de Letras/FAMASUL

O poeta Vital Correia diz que “escreve de uma forma arrebicada, e que não é para se entender e muito menos para sentir.” Pois,  defende que a poesia é o reino indizível. Por esse motivo, não pode ser entendida pelos escassos conceitos seculares. Sua poética é de natureza fechada e dificílima compreensão. Ela expressa às ideias intangíveis, que não podem ser compreendidas pela lógica tradicional, pois está além da compreensão. Vital também ressalta “que a poesia precisa sair da literatura. A poesia é importante, o resto é literatura”. Foi curioso e muito importante conhecer um pouco mais de sua poesia.


6. NORMALIDADE É A PIOR COISA QUE TEM NO MUNDO
Jarian Amélia/ IV Período de Letras/FAMASUL

Vital Corrêa de Araújo afirma que “A normalidade é a pior coisa que tem no mundo. Devemos sair dela”. Sabemos que norma quer dizer regra, e normal já é uma coisa que se espera e nos dá uma ideia de cópia, porque tudo que é normal, termina ficando igual a tudo e a todos. Entende-se que devemos mudar, modificar, reproduzir e não copiar. Desta forma, não estamos seguindo uma regra e é justamente isso que ele propõe. O poeta diz também que, “O pensamento atrapalha a poesia, a poesia é um jogo, devemos tirar todo pensamento.” Isso mostra que a poesia não tem nada a ver com o pensamento, a poesia são os versos escritos sem um conteúdo elaborado. Assim, não é preciso se fazer um estudo de combinação de palavras, não é preciso organizar, e nem elaborar pensamentos para formar a poesia, a poesia é um jogo de palavras. Vital mostrou uma maneira diferente, um lado ainda não despertado quando fala do pensamento, da poesia e da normalidade.


7. AUGUSTO DOS ANJOS VISTO POR VITAL CORRÊA
Cícera Williana Queiroz Pereira/ IV Período de Letras/FAMASUL

O professor, escritor e poeta pernambucano Vital Corrêa de Araújo, falou em sua palestra sobre os cem anos de publicação do livro de poemas “Eu” de Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos, poeta parnasiano simbolista, denominado “Um Anjo Triste”, que se inspirava com as coisas mais insólitas. Vital defende que “a poesia não é para dar o ensino moral, não é para dar recado, não é para explicar coisas, não é para dizer o que a massa faz” – e continua - “a poesia é feita de significantes e não de significados” Comparando-se, por exemplo, ao que pregam certas doutrinas cristãs, que se observa e segue-se ao pé da letra o que está escrito, a doutrina poética não se prende ao que está posto no papel (significado), mas, sobretudo ao que a imaginação e a criatividade nos levam a crer (significante). Neste sentido, Augusto dos Anjos era um mestre, imortalizado pelos seus pensamentos à frente de seu tempo.


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16 de junho de 2012

PALESTRA SOBRE GONZAGA


ADMMAURO GOMMES MINISTROU PALESTRA NA FAMASUL SOBRE
A POESIA DE LUIZ GONZAGA
30 DE MAIO DE 2012


A PALESTRA: UNINDO POESIA COM MELODIA
Honória Maria Francisca da Silva/IV Período de Letras



Honória Maria

            O professor Admmauro Gommes mostrou em sua palestra que teve como tema “A Poesia de Luiz Gonzaga”, a poeticidade existente nas músicas Asa Branca, Sabiá e Qui Nem Jiló. “Apenas as três, porque o tempo não dá para falar de todas” destaca o professor. Esta última, por exemplo, da qual eu irei comentar, ele afirma que foi escrita há mais de 63 anos, dizendo que é um poema que consegue ultrapassar gerações, ressaltando que permanece ainda atual, "parece que foi escrita ontem", e recita o poema, “Qui Nem Jiló”. Logo em seguida, a Banda Musical Ipiranga de Xexéu, convidada para abrilhantar ainda mais o encontro, tocou esta música, “unindo a poesia com a melodia”, destaca o palestrante. Neste mesmo texto, o professor chama a nossa atenção para a parte literária, comentando que mesmo Luiz Gonzaga se afastando do Nordeste e indo para São Paulo e Rio, não perdeu as raízes nordestinas, considerando ainda, as ilustrações da música, ao lembrar que as metáforas foram todas ligadas ao passo nordestino. Afirmou ainda, que jiló é uma planta amargosa que o cantor compara com a saudade e completou: “tratou de um elemento universal. É isso que chamamos de plasticidade cultural: o tema é universal, mas a motivação é  local”. O professor também alinhou os três temas, Sabiá, Qui Nem Jiló e Asa Branca, e percebeu um fio condutor que atravessa as três canções; “A Saudade”. A paixão pela poesia que o professor Admmauro Gommes tem, é contagiante e, usando a música do cantor Luiz Gonzaga, para mostrar a poesia em sua arte, favoreceu ainda mais, um brilho inexplicável.















EU TAMBÉM ESTIVE LÁ

TACIANA SIQUEIRA - Letras/FAMASUL: “Parabéns Professor Ademauro Gomes pela sua aula sobre Luiz Gonzaga, o senhor deu um SHOW, não precisa de Data Show, nem microfone muito menos computador, o senhor é o cara. Fiquei super feliz em assistir a sua aula.”

MERCIA ROSÂNGELA ALCÂNTARA - 7º Letras/FAMASUL: - “Realmente Tacy. Esse homem é dotado de uma sabedoria imensa, cada vez que nos deparamos com seus ensinamentos tomamosciência de que temos ainda muito a aprender. Assim é que percebemos que tiramos dele a INSPIRAÇÃO de escolhermos esse curso. E parabéns para nós que tivemos essa oportunidade.”




ELISÂNGELA ALVES DA SILVA -  V PERÍODO de LETRAS: "A palestra sobrea vida e obra de Luiz Gonzaga pode-se dizer que foi uma pérola, sendo Gonzaga exemplo do povo nordestino. O palestrante, professor Admmauro, foi de amplitude e magnífica. Seu relato sobre a grande referência nacional, Luiz Gonzaga, foi maravilhosa. Gostei muito. Parabéns! O senhor me deixou encantada em sua palestra. Abraços. "

OSANI SEVERINA - V Período de Letras/FAMASUL: “Falar que Luiz Gonzaga é o REI DO BAIÃO é fácil, argumentar é mais fácil ainda, para aqueles que possuem uma mente aguçada e uma metodologia refinada. O tema da palestra foi um desafio que superou todas as expectativas no que é essencial saber."
Eu compus até este poema:


AS CORES



Gonzaga é poema
Revestido das letras, incensa a alma
E por trás de sua dupla veste 
Impulsiona outros artistas (Elba Ramalho)
A reconhecer a bravura do entrelaçar de cores
São cores quentes, cores frias
Cores em uma perfeita harmonia
Demarcam o centenário
Através da poesia
Desbotam-se da janela
As mais diversas cores
Naufragando a intensidade
Formando um rio de cores
Os números se repetem de forma circular,
Mas tudo se renova a partir de um novo olhar
As estações chegam, aquecem e fazem vibrar
Da alma nordestina
Tece o contentamento
Emerge um arco-íris
Em espaço apertado
Conhece, reconhece e faz agir
No reconhecimento
O porvir cultural
A tinta vermelha em circulação
Vidas inocentes reconhecerão
A grandiosidade do rei do baião
Salve, ó Gonzagão!



VANESSA PAULA DOS SANTOS  - IV DE LETRAS: “A palestra serviu para nos mostrar um lado sentimental, regional e cultural vivenciado na música de Gonzaga, fazendo com que pudéssemos de uma forma geral ver com outros olhos o mundo idealizado, que perdurou até os dias de hoje nas obras do Rei do baião. Parabéns, professor, por ser tão flexível de levar aos seus alunos e ouvintes a literatura de uma forma simples, na qual deixou todos maravilhados pelo valor de sua grandeza.”

EDMILSON EVALDO DA SILVA - IV Período de LETRAS: “A Banda Musical Ipiranga tocou divinamente. O tema da palestra foi maravilhoso, pois conhecer alguma música do Rei do Baião todos conhecem mas saber um pouquinho mais de sua história, é algo fora do comum. O que dizer do palestrante Admmauro Gommes? Mestre de uma imensa sabedoria e, como sempre, ensinou e encantou a todos.”

ROZINEIDE LOPES - V Período de LETRAS/FAMASUL: "Não se permite falar do Nordeste, enquanto cultura, sem citar o grande Luiz Gonzaga. Músico simples e de imensa modéstia que conseguiu ver e retratar sua terra com uma visão/emoção até então nunca revelada, por meio da poesia que virou música. Esta, por sua vez, virou história e transformou-se num painel cultural, um retrato fiel da nossa região."

JUCELI E MARLUCE – VI Período de LETRAS: “A palestra nos mostrou ainda mais a importância deste artista brasileiro no meio literário, musical e até social. Vivemos um momento emocionante com a interpretação do palestrante Admmauro Gommes e a Banda Ipiranga que nos prestigiaram com seus talentos e saberes.”

ZULENE LIRA DE OLIVEIRA - V Período de LETRAS: “É gracioso ouvir a apresentação do professor Admmauro Gommes, mediante a sua indiscutível oratória. Registro meus agradecimentos por ter sido contagiada por um show de história, música e vida de um grande mestre da música regional e popular brasileira.”


FLÁVIA - I Período de LETRAS: “Professor: é incrível sua habilidade e método pelo qual passa o conhecimento para nós, alunos. Se eu já gostava de literatura, agora muito mais. Aliás, “deu saudade” de Luiz Gonzaga.”


EDNALDO PORTELA – LETRAS: “Foi fantástica a fala do professor Admmauro Gommes quando, de forma clara, nos trouxe a grandeza e a riqueza para todos nós nordestinos que amamos este lugar, o valorizamos e estamos vivenciando o centenário desse imortal artista que foi Luiz Gonzaga.”           



O que Gonzaga representa para o Nordeste?

Karoline Serpa:“Luiz Gonzaga: O nordeste em carne viva.”
Tamiris Manuela: Luiz Gonzaga, o Rei do Baião é uma importante figura da música popular brasileira e também uma grande figura pernambucana que incorporou a nossa literatura a saga e vida do Sertão.”
Ivandelma Gabriel:Através de palavras, ele conseguiu desnudar a alma do povo nordestino, revelando as angústias, anseios e esperanças do povo castigado pela seca.”




 

15 de junho de 2012

ARTIGOS SOBRE LUIZ GONZAGA


ESTAMOS AGUARDANDO O SEU ARTIGO
SEMELHANTE À ESTRUTURA DOS TEXTOS SEGUINTES
envie para admmaurogommes@hotmail.com





  
Ednaldo Portela

AS NARRATIVAS DA VIDA SIMPLES
NA LINGUAGEM POPULAR DE LUIZ GONZAGA

Ednaldo Portela S. Moura (Letras/FAMASUL).


O Rei do Baião ou o mito Luiz Gonzaga, pai de Gonzaguinha como ele costumava frisar, foi um mestre no arranjo das invenções da Música Popular Nordestina repleta de coco, xaxado, xote, forró tradicional e o baião, onde todos esses estilos foram implementados de versos matutos e escancaradamente de características incomparáveis. Na sua longa trajetória na música, cantou alegrias, tristezas, denunciou as injustiças dos homens, louvou a devoção aos santos e principalmente narrou o problema da seca do Sertão pernambucano. Suas músicas comportam a essência mais autêntica do que realmente viveu aquilo que cantou. Em muitos dos seus relatos, sua vida era sua obra, e sua obra foi eternizada no seu ofício de louvar a vida de uma maneira simples, dizendo aquilo que por experiência carregava na memória e perpetuava no que cantava.  Na visão de estudiosos, como Terra (2001: 22 e 23),
“É importante afirmar que só falava e escrevia bem quem seguisse o padrão imposto pela gramática normativa o chamado nível ou padrão formal culto. Porem, no contemporâneo observa-se que existe outra linguagem, aquela utilizada pelos falantes segundo os linguistas”. 
Nota-se, contudo, que esse tipo de linguagem é muito frequente nas composições do Rei do Baião e de seus parceiros e compositores, chegando até a ultrapassar os limites da normalidade virando assim, uma marca desse artista que extraia das lições de vida, histórias amatutadas chamadas de causos, que no mínimo, surgia como uma nova expressão artística dentro de uma que já era por natureza, a sua maior marca: A música. Podemos tomar a título exemplificativo os excessos que se seguem na música “Pau de Arara” (GONZAGA e MORAIS) que além de retratar muito claramente sua vida simples, narra sua trajetória na história da música para a vida e da sua vida:

“Quando eu vim do sertão seu moço
Do meu bodocó
A maloca era um saco
E o cadeado era o nó
Só trazia a coragem e a cara
Viajando num pau de arara
Eu penei, mas aqui cheguei
Trouxe o triângulo
Trouxe o gonguê
Trouxe o zabumba
Dentro do matulê
Xote, maracatu e baião
Tudo isso eu trouxe no meu matulão...”

Nas expressões utilizadas nas artes musicais podem ser percebidas claramente, narrativas da vida simples do povo da sua terra. A abordagem é do ponto de vista de quem viveu tal realidade pela intimidade que a letra demonstra ao falar dos seus pertences do dia a dia, de alguma saudade que se faz presente e principalmente, palavras ditas na linguagem simples, ou mesmo, regional. É por isso que segundo a concepção de Ferreira (1987), em duas de suas definições da palavra arte assim se expressa:

atividade que supõe a criação de sensações ou de estados de espírito, de caráter estético, carregados de vivência pessoal e profunda, podendo suscitar em outrem o desejo de prolongamento ou renovação»...; «a capacidade criadora do artista de expressar ou transmitir tais sensações ou sentimentos....
Luiz Gonzaga, na sua simplicidade tipicamente de quem viveu diante de uma realidade de sofrimento no Sertão pernambucano em tempos de fome e miséria, exprime em suas composições justamente o que Ferreira (1987) define com relação à arte, pois dentro de uma linguagem artística tão complexa, que é a musica, ele utiliza exemplos da sua vida pessoal destacando, por exemplo, a saudade, que se trata de uma sensação ou um sentimento que é “a capacidade criadora do artista de expressar...”
Podemos ainda perceber as influências da vida do Rei do Baião, quando em algumas das suas canções, ele retrata a alegria em poder viver uma vida simples explorando principalmente a memória da sua infância ou o desejo de conseguir concretizar o sonho de tempos distantes nas músicas. Nas músicas “Asa Branca” (GONZAGA e TEIXEIRA) e Riacho do Navio” (DANTAS e GONZAGA), percebe-se claramente a típica linguagem do sanfoneiro e sua história em tempos de seca, fazendo alusão a duas situações distintas, ambas com características adversas, mas que frisou a realidade de um sonho duplo: de partir e de ficar. Numa,  a tristeza pela seca e pela sua ída ao mundo civilizado, como é clara a a firmação em Riacho do Ravio, outra, a narrativa de uma realidade de sofrimento e êxodo da sua terra natal: 
“Que braseiro, que fornaia
Nem um pé de plan-ta-ção
(Por farta d'água perdi meu gado
Morreu de sede, meu alazão)
Inté mesmo a asa branca
Bateu asas do  sertão
(entonce eu disse, adeus Rosinha
Guarda contigo meu coração)

“Há se eu fosse um peixe
Ao contrário do rio
Nadava contra as águas
E nesse desafio
Saía lá do mar pro
Riacho do Navio
Saía lá do mar pro
Riacho do Navio
Pra ver o meu brejinho
Fazer umas “caçada”
Ver as "pegá" de boi
Andar nas vaquejada
Dormir ao som do “chucái”
E acordar “cás” “passarada”
Sem rádio e nem “nutiça”
Das “terra” “civilizada”
Sem rádio e nem “nutiça”
Das “terra” “civilizada”


               Apreciando algumas narrativas históricas, podemos compreender o movimento da cultura musical, como sendo uma das formas mais complexas de expressão artística, pois abrange os aspectos referentes aos problemas sociais, envolvendo nela outras linguagens artísticas como o teatro e a dança, além de poder atingir todas as camadas sociais sem distinção nem como dizia ele “Sem pra que isso” (GONZAGA, 1994).  O zabumba, o triangulo, a sanfona, as vestimentas típicas, o gibão, o seu típico chapéu de couro demonstra a abrangência folclórica que esse mestre do Sertão pernambucano representa. Segundo Gaertner (2010),

Na música isto ocorre nas mais variadas instâncias, desde os esforços de apreciação artística até a aquisição da expertise instrumental. Porém, não é raro que, na transmissão do discurso histórico, os questionamentos historiográficos passem despercebidos (...) através de exemplos tradicionais do discurso histórico da música ocidental.

               O mestre pernambucano, nascido em 13 de dezembro de 1912, Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, deixou para a humanidade um legado cultural que ainda hoje influencia artistas novos e novíssimos artistas no Brasil. A sua luta foi complexa, mas à sua maneira, deixou a marca do povo nordestino, especialmente pernambucano fazendo uso da sua simples linguagem narrando à realidade até então desconhecida pelo povo brasileiro com relação ao nordeste que o próprio cantor, compositor e sanfoneiro afirmava ser tão esquecido. A nossa cultura, como é de acordo e coerente afirmar, tão rica como o Rio São Francisco em águas, cuja colaboração imparcial, é a história desse mestre que fez da sua vida, uma vida de viajante, levando a história do povo sofredor alegre e triste, sonhando com o retorno à sua terra, talvez, debaixo de uma asa branca tão sonhada, porém tão dolorosa.

Para o Rei Luiz Gonzaga, suas narrativas da vida simples na linguagem popular, ou na sua linguagem, tenha representado algo muito natural pela sua experiência e intimidade com as coisas simples da sua jornada, porém, talvez, não percebeu ele, que das linguagens mais ingênuas, estava a capacidade de registrar por meio de metáforas simples, as maiores riquezas que uma nação pode considerar: a sua história, ou a história de um povo.


REFERÊNCIAS

FERREIRA. Aurélio Buarque de Holanda. O Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. São Paulo. Editora Nova Fronteira. 2ª Ed. 1987. Disponivel em http://www.pitoresco.com.br/art_data/arte/, acessado em 17-06-2012.

GAERTNER. Leandro. Revista eletrônica de musicologia, Volume XIV, 2010. Disponível em http://www.rem.ufpr.br/_REM/REMv14/03/historiografia_como_ferramenta.html acessado em 17-06-2012.


GONZAGA, Luiz. DANTAS, Zé. DVD Show De Despedida, Riacho do Navio, 1955. Disponível em http://cliquemusic.uol.com.br/discos/ver/a-viagem-de-gonzagao-e-gonzaguinha , acessado em 17-06-2012. 

GONZAGA. Luiz. TEIXEIRA. Renato. Asa Branca, 1947. Disponível em www.gonzagão.com.br ., acessado em 17-06-2012. 

MORAIS. Guio de. GONZAGA. Luiz. Pau de Arara, 1952. Disponível em www.gonzagao.com.br ., acessado em 17-06-2012.
TERRA, Ernani. Português. Scipione 1ª. Ed. São Paulo, 2001.
  





O REGIONALISMO NA MÚSICA VITÓRIA DE SANTO ANTÃO DE LUIZ GONZAGA

Tamiris Manuela Santos da Costa /4º Período de Letras (FAMASUL)

Luiz Gonzaga foi uma das figuras mais completas da música popular brasileira, cantando sempre acompanhado de sanfonas, zabumbas e triângulos. Ele levou a alegria para todo o mundo, principalmente para as cidades nordestinas, onde anima até hoje as festas juninas e os forrós pé-de-serra dessas regiões, com os ritmos, baião, xote e xaxado.  Suas composições tratavam de diversos temas, dentre esses se destaca o regionalismo que o cantor usava em suas composições, para valorizar a cultura de determinada região, como pode ser observado na música Vitória de Santo Antão (Gonzaga, Soares e Pilombeta. 2012). O regionalismo que é apresentado nesta música, busca transmitir aos ouvintes os costumes da cidade, destacando pontos como a alegria das festividades religiosas, as comidas típicas e todo tipo de cultura que faz com que as festas da cidade sejam visitadas por pessoas de todos os lugares.

Conforme FERNANDES (1980, p.1093), “regionalismo é o sistema ou partido dos que defendem interesses regionais; palavra ou frase peculiar a uma região ou regiões; podendo também ser apresentado como caráter regional de uma obra literária.” Desse modo, entende-se que o regionalismo está muito presente nas obras literárias, como em Luiz Gonzaga, para retratar os interesses particulares de determinada região, neste caso os de Vitória de Santo Antão.

Nota-se que se pode encontrar o regionalismo em diferentes situações, como em uma apresentação ou definição dos interesses regionais, nas características linguísticas específicas de cada região e também em obras literárias. Não importa onde seja encontrado, sempre terá a mesma função, de apresentar o conjunto da cultura existente em determinado lugar, diferenciando de uma a outra, devido ao fato que cada local tem sua própria cultura. Por consequência da diferença cultural de cada lugar acontecem as diferentes formas de expressão, fala e representação. Em outras palavras, Gonzaga buscava descrever o modo de agir do povo de Vitória e sua forma de representação. E é o que vemos ao analisar o texto de Vitória de Santo Antão (op.cit.: Gonzaga, Soares e Pilombeta):

Aqui vou deixar meu coração
Adeus Vitória de Santo Antão
Vem gente até de Recife
Pras novena de Vitória
Pra comer rolinha assada
Ribançã frita na hora
As ruas fica intupida
De gente que vem de fora
São nove dias de festas
Quando acaba a gente chora
Lá na roda do lotero
Tem tudo que a gente quer
Chá de burro, sarrabúio
Torresmo, sarapaté
Tem tapioca de coco
Rosário de Catolé
Aprendi até as musgas
Dos toques dos carrocé.     
                                                                                          
A música pode ser considerada como uma forma de arte, uma prática cultural e humana, que busca apresentar as características de um povo. É raro alguma civilização não possuir alguma manifestação musical própria, pois esse tipo de obra percorre não só a cidade de origem, mas também todo o mundo e pode ser considerada como uma forma de divulgar a cultura e os pontos turísticos da região. Na musica citada, podemos observar que o compositor passa aos ouvintes uma característica própria da cidade em questão e o objetivo principal é despertar naqueles que não conhecem as festividades da cidade, em vir conhecer e participar de momentos de grande alegria. Na concepção de HENRIQUES (2012):
Música é a arte de combinar sons de maneira lógica e coerente, onde se propicia um contexto sonórico rico em significados. A linguagem musical transcede as palavras, sendo originada a partir da combinação de sons e pausas (silêncio) ao longo de uma linha de tempo.

Luiz Gonzaga utiliza exatamente o que disse Henriques em sua composição. Ele combina os sons de maneira coerente, passando para os ouvintes a mensagem desejada, através de uma rica linguagem, cheia de sons e significados. Ele faz uso dessa combinação para transmitir e divulgar os costumes daquele lugar de uma maneira tão bem elaborada, que além de propagar a cultura, também anima com a referida composição diversos festejos de caráter nordestinos ou sertanejos. Sem dúvidas alguma, a música revela, da melhor maneira possível, uma característica cultural. Com seus instrumentos musicais, ele retrata os costumes, belezas e riquezas que só existem naquela região. Através de seu repertório, o cantor cria um ambiente aconchegante do local que, com certeza, alcançará seu objetivo, de atrair a curiosidade das pessoas em conhecer uma nova cultura. Considerando que uma manifestação musical pode ser considerada como uma obra, pertencente a nossa literatura brasileira, o professor Jaqueirense, Ricardo Guerra, afirma que (Silva, 2007:17):

Condicionada pela tradição cultural e pelo devir histórico, a literatura tem, no entanto, uma dimensão que não se define somente pelas circunstâncias em que se produz. Nela, o talento individual do artista e a sensibilidade para os problemas de seu tempo são determinantes para mostrar, discutir ou criticar os principais aspectos de uma cultura.


Baseado nessa concepção foi que Luiz Gonzaga mais dois compositores, criaram a música “Vitória de Santo Antão”. Ele utilizou todo conhecimento histórico que possuía da referida região para elaborar sua obra, enriquecendo-a com toda característica musical possível para atrair a atenção o máximo de pessoas. Os autores foram inspirados por toda tradição que a cidade possuía e souberam organizá-la tão perfeitamente que esta música como tantas outras do Rei do Baião fez tanto sucesso. Ela transmite não só as características culturais de um povo, mas também deixa em evidência o grande talento que Gonzaga possui, pois não bastava apenas cantar as características regionais da cidade, era necessário também que ele soubesse organizar essas informações de modo a chamar a atenção das pessoas e isso se fez com grande autoridade.
Portanto, a obra do nosso grande Rei do Baião pode ser considerada como uma excelente composição da forma de expressar o regionalismo presente nas cidades de nosso Estado.


REFERÊNCIAS

FERNANDES, Francisco. Dicionário Brasileiro Globo Ilustrado. 7. ed. Porto Alegre: Globo, 1980. V3.

GONZAGA, Luiz; SOARES, Elias e PILOMBETA. Vitória de Santo Antão. Disponível em http://letras.terra.com.br/luiz-gonzaga/1565374, acessado em 24-05-2012.

HENRIQUES, Cláudio. Significados de Músicas. Disponível em http://www.dicionarioinformal.com.br/música, acessado em 23-05-2012.

SILVA, Ricardo Antônio Guerra da. et. al. Estudos Literários e Sociolinguisticos. Artigos em Língua e Literatura. Recife: Bagaço. 2007.







A PLASTICIDADE CULTURAL NA
MÚSICA ASSUM PRETO DE LUIZ GONZAGA

Cícero Felipe Ramos da Silva (Letras/FAMASUL)


Em termos simples, é possível afirmar que a plasticidade cultural caracteriza-se pelo uso artístico de elementos nitidamente regionais, como, por exemplo, a linguagem, os costumes, as tradições, e que tem por finalidade extrair destes o valor e a verdade universal. Por assim dizer, não são apenas os aspectos regionalistas que estão, no fazer artístico, em jogo, mas o que estes têm de sinfrônico, de sublime e, que merece ser retratado e comunicado por meio da arte. A esse respeito, GOMMES (2008:59), em aguda reflexão sobre a plasticidade cultural, esclarece que

Existe algo mais profundo por trás dessa representação cultural; há uma crítica sobre a própria vida, num jogo aparentemente simples, construído de maneira possível, para que se entendam valores universais, a partir de elementos presentes na cultura nativa. 

Com efeito, na ampla gama das representações artísticas brasileiras, há um número muito expressivo de artistas que se destacaram por usar o regionalismo como fonte primária e cardinal de suas produções culturais. Estes, portanto, pertencem aos mais diversos gêneros, a exemplo, na música e na literatura. Na literatura, por conseguinte, destacamos os autores: Ariano Suassuna, José Lins do Rego, Guimarães Rosa, Manuel Correia de Andrade, Ascenso Ferreira, José Américo de Almeida, Euclydes da Cunha, Gilberto Freyre e dentre outros. Na música, não obstante, é possível elencar Gonzaguinha, Elba Ramalho, Alceu Valença e o nome mais afamado e que representou com grande desenvoltura e maestria o regionalismo nordestino: Luiz Gonzaga.

Este foi, por meio da sua música, um mestre regionalista por excelência, de grandeza incomparável e que fez dos aspectos regionais por ele observados uma usina, um canteiro para que artisticamente, se refletissem as verdades universais que o sertão padrasto continha. Desta feita, a música de Luiz Gonzaga se faz revestida de uma plasticidade cultural nitidamente observada. Ele incorpora às tradições, os costumes, a linguagem e mesmo faz, de forma um tanto satírica, uma análise psicológica do nordestino: sua malícia e sua malandragem. A obra de Gonzaga é um autorretrato dessa malandragem, é uma pintura dos caracteres e trejeitos do nordestino; da sua alegria, da forma como dribla o sofrimento e faz da vida menos penosa, da maneira como retira do sofrer o canto, o ritmo. Aos olhos de Luiz Gonzaga o nordestino era, acima de tudo, um forte; um ser que merecia ter sua força representada – e sua alegria cantada. Toda a sua obra tende para uma plasticidade cultural claramente ressalvada e, se pode prenotar, como exemplo de tal plasticidade a música Assum preto, na qual a liberdade e a cegueira do pássaro triste se fazem confundir com a liberdade e a cegueira do nordestino. Atente para esses versos de Gonzaga e Teixeira:


Tudo em vorta é só beleza
Sol de abril e a mata em frô
Mas assum preto, cego dos óio
não vendo a luz, ai, canta de dor.

Tarvez por ignorança
ou mardade das pió
furaro os óio do assum preto
para ele assim, ai, cantá mió

Assum preto véve sorto
mas num pode avoar
mil vez a sina de uma gaiola
desde que o céu, ai, pudesse oiar

Assum preto, meu cantar
é tão triste como o teu
também robaro o meu amor
que era a luz, ai, dos óios meus.

O texto em destaque, em sua primeira estrofe, começa por descrever a beleza de um lugar um tanto quanto inusitado, sendo situada (a beleza) numa ambientação campestre e pastoril onde em períodos de estação chuvosa o reverdecimento da mata faz com que a mesma se torne mais esplêndida, mais grandiosa, em visível contraste aos aspectos desérticos do referido lugar. Em todo o texto, entretanto, é expressa a tristeza do pássaro e do eu lírico que se fazem percebíveis como quando em “mil vez a sina de uma gaiola desde que o céu, ai, pudesse oiar”, ou em “também robaro o meu amor que era a luz, ai, dos óios meus.”

Há também neste texto uma visível incongruência: o pássaro é “livre”, possui “liberdade”, mas se faz, por consequência de sua cegueira, incapaz de voar. Aqui chegamos ao ponto de caráter universal que pode deste texto ser inferido: a liberdade. O universalismo, pois, não é analisado pelas expressões corriqueiras do local: pela representação da linguagem e da fala nativa. O universalismo também não se faz tão percebível quando em se tratar das ambientações do mencionado lugar como em “Tudo em vorta é só beleza, Sol de abril e a mata em frô”. Mas o universalismo se enfatiza, sobretudo e precisamente, pelo tratamento de um tema universal: a liberdade. A liberdade, pois, do Assum Preto é limitada, uma vez que sendo cego se faz para ele simplesmente impossível alçar voo nos céus do sertão. Metaforicamente falando, o assum preto representa a imagem do sertanejo, pois este é “livre”, mas não pode voar pelos inúmeros fatores que culminam por caracterizar sua cegueira: a falta de educação adequada, a falta de perspectiva profissional e etc.
O sertanejo é preso ao seu lugar como o era o assum preto em decorrência da sua cegueira. Com efeito, o Assum Preto teve seus olhos furados na justificativa de que através desse meio ele poderia aperfeiçoar seu canto e isto se deu por mera ignorância ou por pura maldade. O sertanejo não tem os olhos furados (talvez, quem sabe), mas é castigado pelas constantes secas, pela falta de perspectiva em meio a um sertão padrasto, como que Deus ou o acaso visasse aperfeiçoar sua alma (do sertanejo) por meio do sofrimento. No entanto, da mesma forma como o Assum Preto encontrou razão para cantar, o sertanejo também encontra essa razão em face de um ambiente um tanto inusitado. Luiz Gonzaga foi mestre em fazer tal contemplação, aliás, ele foi um contemplador do belo. Soube encontrar beleza onde olhos comuns jamais (talvez, dificilmente) encontrariam. Para CURY (2003:36), “contemplar o belo é fazer das pequenas coisas um espetáculo aos nossos olhos.” Apenas um contemplador do belo seria capaz de encontrar beleza em um Assum Preto e, além do mais, com os olhos furados. Nisto se resume a visão universalista da vida e, portanto, sua plasticidade cultural. Neste ponto, volta-se a citar GOMMES (op. cit. 58) ao dizer que


Existe algo mais profundo por trás dessa representação cultural; há uma crítica sobre a própria vida, num jogo aparentemente simples, construído de maneira possível, para que se entendam valores universais, a partir de elementos presentes na cultura nativa. 


Há muito mais na obra de Luiz Gonzaga que mera representação cultural; há um retrato da ambientação nordestina, dos trejeitos, da alegria, da malandragem e da alma do sertanejo: este forte que encontra o prazer de sorrir onde outros dificilmente encontrariam. E é essa análise que toma como ponto de partida o que é meramente regional para se elucubrar (ou cantar) temas universais como a liberdade e o amor – como é o caso da música Assum Preto – que nos remetem ao entendimento do universalismo na obra de Luiz Gonzaga e, portanto, de sua plasticidade cultural.  

REFERÊNCIAS:

CURY, Augusto. Dez leis para ser feliz.  Rio de janeiro: Sextante, 2003.
GOMMES, Admmauro. Intradução poética. Recife: Edições Bagaço, 2008.
GONZAGA, Luiz e TEIXEIRA, Humberto. Assum preto. Disponível em  http://letras.terra.com.br/luiz-gonzaga  Acessado em 10/05/2012.


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